Em 2019, o rendimento médio dos paraenses foi de
absurdos R$ 795, menos que o salário mínimo de R$ 998 naquele ano. Não bastasse
o valor per capita irrisório, o rendimento de um paraense é lamentavelmente o
4º pior do Brasil, atrás apenas do que, em média, têm um maranhense (R$ 637) e
um alagoano (R$ 729). E é pouco mais da metade do resto do Brasil (R$ 1.406).
Parece contrassenso quando se considera o fato de que o Pará é um dos quatro
estados que mais exportam no país e o que mais gera riquezas minerais de interesse
global, mas o estado está em situação falimentar, do ponto de vista social.
A constatação disso pode ser averiguada nos números
do principal estudo sobre a análise das condições de vida da população
brasileira, a Síntese de Indicadores Sociais (SIS) 2019, publicada na manhã
desta quinta-feira (12) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE). O Blog do Zé Dudu analisou as dezenas de tabelas com os microdados do
estudo e concluiu que a desigualdade no Pará praticamente se acomodou e o
lançou à triste situação de um dos piores em oferta de condições básicas de
vida à população.
O quesito rendimento per capita, na verdade, é
apenas um dos problemas, que se agravam e agravam a vida de todos no
comparativo com 2018, quando o rendimento era R$ 878 no estado — ou seja, de um
ano para outro, os domicílios paraenses empobreceram 9%. Belém, capital do
estado, é a capital que apresentou a maior perda de rendimento domiciliar per
capita de 2018 para 2019, passando de R$ 1.737 para R$ 1.399, uma baixa nominal
de R$ 338 não vista em qualquer das demais capitais.
Para piorar, 50,9% da população paraense
sobreviviam com até meio salário mínimo. Nem parece o mesmo Pará que exportou
17,84 bilhões de dólares (ou R$ 75,6 bilhões) em riquezas da terra ano passado.
Só Maranhão (58,5%), Alagoas (54,1%) e Maranhão (52,4%) tinham contingentes
ainda maiores de população de baixa renda vivendo sob o fogo cruzado entre a
fome e a falta de dinheiro para o sustento.
Esses dados combinam com outro, tantas vezes já reportado
pelo Blog, que mostra o elevado grau de informalidade entre os trabalhadores
paraenses. Segundo o IBGE, a taxa de informais na maior economia da Região
Norte era a maior do país em 2019, alcançando 67,9%. Supera Maranhão (65,4%) e
Piauí (65,1%) e é praticamente o triplo de Santa Catarina (23,4%) ou mais que o
dobro do que se registra no Rio Grande do Sul (30,4%), São Paulo e Paraná
(ambos com 31,4%).
Medição da desigualdade
No Pará, a desestruturação de rendimento que causa
o empobrecimento da população é percebida de maneira tão igual que causa um
fenômeno de “redução suave” da desigualdade. Isso porque, por haver milhões de
cidadãos considerados de baixa renda, não há grandes variações entre quem é
muito pobre e muito rico, o que derruba o Índice de Gini, um coeficiente
utilizado para mensuração da desigualdade. Na prática, os muito pobres do Pará
compõem volumes acima do normal e os muitíssimos ricos são escassos em relação
às demais Unidades da Federação.
O índice de Gini no Pará ficou em 0,529 em 2019 — e
quanto mais próximo de zero menos desigual é a localidade. No Brasil, o índice
é de 0,543, ou seja, o restante do país é mais desigual que o Pará. E Belém,
que já chegou a ser a capital com diferença mais gritante entre os muito ricos
e os extremamente pobres, deixou o posto e agora está com índice de Gini de
0,562, o 9º maior entre as capitais, empatada com Manaus.
Ainda assim, o Pará está longe de ser um lugar
desigual de fato. Em primeiro lugar, seus maiores gargalos — educação, saúde,
saneamento básico e geração de emprego formal — estão longe de serem resolvidos
como num passe de mágica e o tornam duas décadas mais atrasado que lugares como
Santa Catarina e São Paulo, por exemplo. Depois, não se verificam políticas
públicas sólidas e eficientes direcionadas à erradicação das mazelas, que estão
concentradas desde as regiões mais ricas até as reconhecidamente mais pobres.
A pesquisa de hoje é apenas mais um dos ensaios do
que o censo demográfico deve encontrar no Pará em 2021: uma população
empobrecida, sem oportunidades e sem acesso a serviços essenciais e básicos,
largada à própria sorte por anos. Esses números, que geram o famoso Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH), desnudarão o estado, mais uma vez, como um dos
mais atrasados socialmente em contraponto ao sucesso de gigantes multinacionais
que a partir daqui fazem fortuna. É a triste lembrança da década perdida de um
Pará muito rico, mas aquele que foi sem nunca ter sido.