Desde o início da pandemia
surge um novo bilionário a cada 26 horas, enquanto 160 milhões de pessoas
foram empurradas para a pobreza. São informações do relatório da Oxfam “A Desigualdade Mata”, divulgado em 16 de janeiro,
onde se constata que os ricos estão cada vez mais ricos e os pobres cada
vez mais pobres. Os 10 homens mais ricos do mundo dobraram suas fortunas
na pandemia enquanto a renda de 99% da humanidade caiu, mostra o estudo.
Estima-se que as desigualdades
são responsáveis pela morte de uma pessoa a cada quatro segundos no
mundo. São, pelo menos, 21.300 vidas perdidas diariamente pela fome, falta
de acesso à saúde pública, violência de gênero e crise climática.
São dados alarmantes que se
confirmam no Brasil: o número de bilionários e suas riquezas aumentou
desde a chegada do coronavírus. Vinte ricaços têm mais riqueza (US$ 121
bilhões) do que 60% da população, o que corresponde a 128 milhões de
brasileiros.
Reportagem da BBC News Brasil
divulgou exemplos desse abismo: o automóvel Porsche, que chega a custar
R$ 1,5 milhão, bateu recorde de vendas em 2020 e 2021. A espera
para comprar helicópteros chega a 20 meses, sendo que pode custar até R$
50 milhões. O mercado imobiliário de luxo cresce 81% em lançamentos e o
investimento financeiro brasileiro no exterior é recorde. Outro dado da
matéria aponta que 2% da população responde por 20% de todo o consumo no
país, genericamente falando.
Mas esses artigos de luxo são
comprados pelos donos de grandes fortunas que estão na faixa de 0,5% da
população, até mesmo nos 0,1% de pessoas que acumulam muita renda e
riqueza.
De outro lado, as famílias
penam com os preços dos alimentos, energia elétrica, gás de cozinha,
gasolina e óleo diesel, que repercutem em todos os demais preços. A
inflação está subindo, corroendo salários, e a política de elevação da
taxa de juros em nada contribui para a melhora da economia. Ao contrário,
afunda o país na crise, empurrando pessoas para a informalidade, para a
fome e para a miséria.
Para que essa concentração de
renda e riqueza seja freada e haja redistribuição, a tributação dos
super-ricos é fundamental, comprovam vários estudos.
Alterar o perfil regressivo do
sistema tributário nacional, incrementar a progressividade e elevar sua
incidência nos mais ricos é onde estão as possibilidades para elevar a
capacidade redistributiva do Estado brasileiro, mostra o Centro de Pesquisa
em Macroeconomia das Desigualdades (FEA/USP) intitulado “Previdência
e assistências sociais, auxílios laborais e tributos: características
redistributivas do Estado brasileiro no século XXI”, divulgado em 26 de
janeiro. Assim, o Estado tem melhores condições para reduzir desigualdade
e garantir direitos.
Em fevereiro de 2021, estudo
divulgado pelo mesmo Centro de Pesquisa demonstrou que a cada R$ 100,00
transferidos do 1% mais rico para os 30% mais pobres é gerada uma
expansão de R$ 106,70 na economia. Também afirmou que uma política de
proteção social financiada a partir de tributos sobre o 1% mais rico
transfere R$ 125,00 para os 30% mais pobres, elevando multiplicador da
economia e gerando um impacto positivo de 2,4% no Produto Interno Bruto
(PIB).
Fora as normas tributárias
distorcidas historicamente, as políticas econômicas favorecem os mais
ricos e não revertem a situação desigual de renda, classe, raça e gênero
que já assolava o país há muito tempo e foi agravada na pandemia.
A maioria da população tem
renda muito baixa, ganha pouco e é quem, proporcionalmente, mais paga
imposto. E a razão para isso é que as classes mais ricas são
subtributadas ou pagam zero de impostos, são isentas.
Entramos no terceiro ano de
pandemia sem que a crise sanitária e econômica, sem precedentes, tenha
terminado. As políticas de auxílio emergencial são importantes, mas
insuficientes em meio a um situação pandêmica que ainda não acabou e
mostrou que a atuação do Estado é fundamental.
Toda essa desigualdade não é
aleatória e tampouco definitiva. Propostas e projetos de lei já existem
para cobrar mais de quem ganha mais. Mas exige ação! Está em andamento,
com o engajamento de mais de 70 entidades, a campanha “Tributar os Supre-Ricos”, cujas propostas no Congresso
Nacional, se aprovadas, podem arrecadar aproximadamente R$ 300 bilhões ao
ano.
Parte delas já tramita no
Congresso Nacional, desde setembro de 2021. Em parceria com a Associação
Nacional em Apoio e Defesa dos Direitos das Vítimas da Covid-19 – Vida e
Justiça, com apoio de 60 parlamentares de quatro partidos, as propostas
agora podem ser apreciadas e votadas.
As políticas econômicas são
fortemente influenciadas pelos que concentram renda, riqueza e,
consequentemente, poder. Portanto, dificilmente a situação de
desigualdade será revertida sem forte pressão popular, das entidades,
associações, sindicatos, movimentos sociais.
A tributação dos super-ricos
deve ser prioridade para enfrentar a desigualdade, o principal problema
brasileiro. Deve fazer parte de um projeto de país, servindo como
instrumento potente e eficaz de redistribuição.
As eleições são uma
oportunidade para impulsionar o debate sobre esse tema crucial. Cada um
pode se contribuir com essa mudança condicionando seu voto a quem defende
a redução da igualdade com justiça fiscal.
O Relatório da Oxfam traz mais
um dado alarmante: se um imposto único de 99% sobre os ganhos obtidos
pelos 10 maiores bilionários durante a pandemia poderia pagar vacinas
suficientes para a população do mundo. E certamente seguiriam sendo
bilionários!
Se as vacinas fossem
distribuídas a todos os países, não teríamos,muito provavelmente, o
efeito da Ômicron e outras variantes e a maioria estaria imunizada e mais
vidas seriam salvas. A desigualdade mata, como afirma a Oxfam. Para
minorar o genocídio gerado pela desigualdade, é fundamental tributar os
super-ricos.
* Maria Regina Paiva Duarte
Presidenta do Instituto Justiça
Fiscal e integrante da coordenação da campanha Tributar os Super-Ricos
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