Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre em aula prática de horta orgânica. Foto: Leilane Marinho/CPI-Acre (Foto: )
Com a
ausência dos presidentes: Emmanuel Macron (França/Guiana Francesa), Nicolás
Maduro (Venezuela), Guillermo Lasso (Equador) e Chan Santokhi (Suriname),
inicia nesta terça-feira (8), em Belém do Pará, a Cúpula da Amazônia, encontro
multilateral que reunirá durante dois dias, representantes de oito países
signatários do Tratado de Cooperação Amazônica (TCA): Brasil, Bolívia,
Colômbia, Guiana, Equador, Peru, Suriname e Venezuela, e três países
convidados: Indonésia (Ásia), República Democrática do Congo e a República do
Congo (África), países cujos territórios, possuem três das maiores florestas
tropicais do mundo.
A Cúpula da
Amazônia segue um roteiro de discussões multilaterais iniciadas em novembro do
ano passado durante a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas
(COP 27), que aconteceu no Egito, quando surgiu a ideia da criação de uma
aliança pelo desenvolvimento sustentável ampliando o alcance da OTCA, com a
inclusão de três países fora da América do Sul, mas detentores de grandes florestas.
Além da
floresta amazônica, que passa em parte pelos territórios de: Brasil, Bolívia,
Colômbia, Guiana, Equador, Peru, Suriname e Venezuela, o presidente brasileiro
Luiz Inácio Lula da Silva — anfitrião do evento —, convidou para as discussões
os chefes de estado da Indonésia, em cujo território passa a grande floresta
tropical de Borneo-Mekong, no continente asiático, e os mandatários dos dois
Congos (República do Congo e República Democrática do Congo), países do
continente africano também detentores de duas grandes florestas.
Parque
Estadual Chandless, Acre. Foto: Agência de Notícias do Acre.
Foram
convidados também representantes da Alemanha e Noruega, na condição de
principais países doadores do Fundo Amazônia, e o primeiro-ministro de São
Vicente e Granadinas, Ralph Gonsalves, que exerce a presidência rotativa da
Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), e o presidente
Sultan Ahmed al-Jaber, dos Emirados Árabes, país do Oriente Médio que sediará a
COP 28, em dezembro deste ano.
Até o
momento, os seguintes representantes estão confirmados no evento e estão
chegando no Hangar, centro de convenções da capital paraense, onde ocorreu
durantes há três dias, os Diálogos Amazônicos, com plenárias temáticas que
elaboraram propostas da sociedade civil organizada que serão entregues para a
apreciação da cúpula.
Já chegaram
ao evento:
• Denis
Sassou Nguesso (presidente da República do Congo);
• Félix Tshisekedi (presidente da República Democrática do Congo);
• Ralph Gonsalves (primeiro-ministro de São Vicente e Granadinas);
• Andreas Dahl-Jørgensen (diretor da Iniciativa Internacional da Noruega para
Clima e Forestas – NICFI);
• Vedis Vik (enviada da Noruega para Clima e Floresta);
• Annette Bull (ministra conselheira da Noruega);
• Rafael Volochen (assessor para Clima e Floresta da Noruega);
• Niels Annen (secretário de Estado Parlamentar do Ministério para Cooperação e
Desenvolvimento Econômico da Alemanha).
Na ocasião,
serão exploradas convergências para iniciar um processo de construção de
posições coordenadas em negociações de temáticas ambientais, iniciadas na COP
28 e na COP 16 de Biodiversidade.
Uma minuta
da Declaração de Belém — como será chamado o comunicado final da cúpula — já
teria sido submetida a diversos ministérios para que possam apontar
sensibilidades e sugerir aperfeiçoamentos.
Entre os
anúncios previstos estão:
• a criação
de um centro de cooperação policial em Manaus
• e a formatação de um sistema integrado de tráfego aéreo.
O presidente
Lula iniciou seu discurso agradecendo aos presentes. No pronunciamento destacou
que a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) não se reunia havia
14 anos e que nunca tinha tido um encontro fora de Manaus.
“Estamos
prevendo medidas para fortalecimento da OTCA, que é o único bloco do mundo que
nasceu com uma missão socioambiental”, disse.
Utilizando
a palavra “união” como chave de seu discurso, o presidente brasileiro destacou:
”Fortaleceremos o lugar dos países detentores de florestas globais.
Fortaleceremos a agenda do combate a mudança do clima e a reforma dos sistemas
de financiamento internacional”.
Exploração de petróleo na
Amazônia e meta de desmatamento zero gera divergência entre países
Dois temas
centrais discutidos antes da realização da cúpula não têm consenso entre os
oito países da OTCA: a exploração de petróleo na Amazônia e a meta de
desmatamento zero até 2030. A minuta da Carta de Belém está sendo negociada com
os diplomatas dos países que buscam pontos comuns.
Para evitar
conflitos, o assunto deverá ser lateral na Carta de Belém. Haverá menção de que
será necessário que projetos de infraestrutura tenham “respeito a critérios
socioambientais” e “consulta prévia a populações tradicionais”.
O
presidente da Colômbia, Gustavo Petro, é ferrenho opositor da ideia de
exploração de petróleo na margem equatorial do Brasil — cuja fase de pesquisa
com perfuração de poços alvos sequer teve início —, diferente do que já ocorre
na Guiana, país vizinho, onde a exploração já está em curso.
Em
julho, durante um encontro preparatório da Cúpula em Letícia, na
Colômbia, Petro questionou abertamente: “Vamos explorar petróleo na Amazônia?”
Nesta
semana, Lula afirmou em entrevista a veículos de comunicação da Região Norte:
“Podem continuar sonhando (com a exploração de petróleo e gás)”, afirmou.
O governo
debate internamente a possibilidade de explorar petróleo na chamada margem
equatorial, uma faixa de 1.100 km que vai do Amapá ao Rio Grande do Norte.
No sábado
(5), houve protestos em Belém contra a possibilidade de explorar petróleo
na Amazônia.
Uma marcha
intitulada “Amazônia Livre de Petróleo” percorreu um trecho próximo ao Hangar,
onde ocorreram uma série de debates sobre meio ambiente.
Uma reunião
para tratar da Carta de Belém, entre os ministros do Meio Ambiente e das
Relações Exteriores ocorreu, na tarde segunda-feira no Palácio do Governo
do Pará, em Belém.
Papel do Brasil
Se quiser
fazer valer suas posições e reassumir a liderança global no combate às mudanças
climáticas, é importante que o Brasil tenha, no mínimo, apoio dos vizinhos.
O Brasil
tem em seu território 62% da floresta amazônica e é responsável por 75% da área
devastada no bioma comum. Em 2022, bateu o quinto recorde anual consecutivo de
desmatamento, com a maior área derrubada em 15 anos — 10.573 quilômetros
quadrados. Nos quatro anos do governo Jair Bolsonaro, a destruição subiu 150%
na comparação com o quadriênio anterior e ultrapassou as áreas dos estados de
Sergipe e Alagoas somadas, o que levou países União Europeia e os Estados
Unidos estudarem medidas restritivas a produtos brasileiros.
Compromisso
com o desmatamento zero não é consenso entre países signatários da OTCA
A troca de
governo e o fortalecimento do Ministério do Meio Ambiente, entregue pelo
presidente Luiz Inácio Lula da Silva novamente a Marina Silva, mudaram a
tendência. De janeiro a julho, o desmatamento caiu 42,5% na comparação com o
mesmo período de 2022. Os alertas abrangeram 7.952 quilômetros quadrados, a
menor área em quatro anos. Em julho a destruição caiu dois terços em relação ao
ano passado. Abriu-se uma perspectiva positiva para metas ambientais
ambiciosas, a cada dia mais necessárias para combater as mudanças climáticas.
A proposta
de Marina é que o encontro da OTCA em Belém resulte na meta de zerar o
desmatamento ilegal até 2030. Entre 2004 e 2012, o Brasil já conseguiu, com o
Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal
(PPCDAm), reduzi-lo em 83%. Não há motivo para não repetir o feito. Se firmar o
objetivo de erradicá-lo até 2030, é certo que os demais presentes também o
adotarão. Mas proteger a floresta — assumindo compromissos mensuráveis — é o
mínimo a esperar dos governos. Tão importante quanto isso é desenvolver na
região alternativas de crescimento sustentável. Práticas ilegais como pesca,
caça, garimpo ou extração de madeira não desaparecerão apenas com a repressão.
O desafio é oferecer caminhos viáveis à população amazônica.
Os
obstáculos não são triviais. Para começar, não há consenso sobre tais
alternativas. Alguns querem banir a exploração de petróleo, enquanto o próprio
Brasil estuda a prospecção perto da foz do Rio Amazonas. Outro empecilho é a
aliança entre políticos locais, desmatadores e garimpeiros. Para não falar na
rarefeita presença do poder público num amplo território que se tornou rota do
tráfico internacional de drogas, madeira e animais exóticos, sob controle do
crime organizado com raízes profundas na região.
Cheia dos
rios no inverno amazônico alaga cidades ribeirinhas
É visto com
bons olhos pela comunidade internacional que os países amazônicos — além dos
oito da OTCA, também a França, soberana da Guiana Francesa convidada para o
encontro em Belém — se reúnam para trocar experiências e formular políticas
comuns. Espera-se, apenas, que a reunião de autoridades seja capaz de ir além
de documentos redigidos na base de promessas vazias e consiga oferecer ao resto
do planeta uma resposta capaz de compatibilizar a preservação e o
desenvolvimento.
Pontos de convergência
A reunião
deverá gerar a Carta de Belém. Esse será um documento que estabelece uma nova
agenda comum para o desenvolvimento sustentável da Amazônia, conciliando:
• a
proteção do bioma e da bacia hidrográfica;
• inclusão social;
• fomento de ciência;
• tecnologia e inovação;
• e o estímulo à economia local e valorização dos povos indígenas, comunidades
locais e tradicionais e de seus conhecimentos ancestrais.
Linha de crédito do BNDES
para a COP 30
O Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o Banco Interamericano
de Desenvolvimento (BID) assinaram na segunda-feira (7), em Belém, a carta de
intenções do programa Pró-Amazônia, que destinará US$ 900 milhões — o
equivalente a R$ 4,5 bilhões — em crédito para microempreendedores individuais
(MEI), pequenas e médias empresas da Amazônia Legal brasileira.
O
financiamento inclui um empréstimo de US$ 750 milhões do BID e US$ 150 milhões
do BNDES para implementar o programa por meio de agentes financeiros credenciados.
A iniciativa busca promover o desenvolvimento sustentável da região amazônica.
Inicialmente, o recurso deve ficar para Belém, que se prepara para sediar a
Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP 30), em 2025.
“Essa iniciativa, seguramente, vai ajudar a fomentar a economia local e,
inclusive, aqui no caso do Pará e de Belém, na preparação da COP”, afirmou o
presidente do BNDES, Aloizio Mercadante.
A ministra
do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, por sua vez, defendeu o fim da
burocracia para financiamento de bancos e enalteceu a medida. “Assinamos, e o
governo federal foi avalista nesse processo, um convênio em termos de
cooperação entre o BID e o BNDES, no valor de R$ 4,5 bilhões, que vai ser
votado em setembro agora, na Cofiex (Comissão de Financiamentos Externos), no
nosso ministério, para que seja aprovada uma linha de financiamento com juros
diferenciados para a Amazônia Legal, para todo micro, pequeno e médio
empreendedor, comerciante, agricultor, prestador de serviços. Isso não é pouca
coisa para uma região como esta”, observou a ministra.
Ainda na
segunda-feira, o BNDES, o BID e bancos de desenvolvimento dos países da Bacia
Amazônica lançaram a Coalizão Verde, cujo objetivo é promover o desenvolvimento
sustentável na região. O anúncio ocorreu durante o seminário Coalizão Verde:
Mobilizando Recursos para o Desenvolvimento Sustentável da Amazônia.
O
presidente do BID, Ilan Goldfajn, destacou a importância da iniciativa. “O
desafio que temos hoje na Amazônia é um desafio que precisa de todo mundo, de
todos os países, dos bancos públicos, precisa integrar não só a questão do
desmatamento, mas também a bioeconomia”, ressaltou. “E não há nada mais forte
do que financiar pequenas e médias empresas, às vezes, até indivíduos que não
têm crédito e que precisam de crédito. Então, essa parceria, essa Coalizão
Verde é muito importante”, acrescentou.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.