Uma alternativa sustentável e
acessível para descarbonizar o transporte fluvial na região amazônica foi
apresentada nesta terça-feira (17), em Belém, no Pará. Trata-se do Poraquê, um
catamarã totalmente elétrico, movido a energia limpa e renovável, resultado de
um projeto da Norte Energia, concessionária da Usina Hidrelétrica Belo Monte,
em parceria com a Universidade Federal do Pará (UFPA). O nome é uma alusão ao
peixe elétrico característico dos rios amazônicos.
A escolha do projeto pela Norte
Energia se explica pela Amazônia ter a maior bacia hidrográfica do mundo. Nessa
região, os barcos representam o principal meio de transporte da população,
especialmente nas comunidades ribeirinhas. No entanto, essas embarcações ainda
dependem de combustíveis fósseis, como o diesel, despejando toneladas de CO₂ na
atmosfera, e comprometendo boa parte da renda dessas famílias pelo alto
custo.
“Ao financiar o projeto,
fomentamos o desenvolvimento científico na região e colocamos à disposição de
toda a população alternativas de eficiência e gestão energética. Além disso,
esse trabalho que tanto nos orgulha, conversa diretamente com os objetivos da
COP 30 [Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025],”
ressalta Andréia Antloga, gerente de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação da
Norte Energia.
A viagem inaugural do Poraquê
ocorreu nas águas do Rio Guamá, que banha o campus da UFPA, e reuniu
professores e estudantes. O barco integra o Sistema Inteligente Multimodal da
Amazônia (SIMA), composto por dois ônibus elétricos que já circulam no campus
da universidade. Juntos, os dois modais transportarão 2 mil pessoas por dia,
com a previsão que deixem de despejar 161 toneladas de CO₂ na atmosfera por ano
– o equivalente a 30 carros populares circulando em um ano. Somente o
catamarã vai impedir a emissão, por ano, de 100 toneladas de gases de efeito
estufa.
O barco é movido a energia solar
fotovoltaica e traz como inovação a utilização de dois motores elétricos de 12
KW cada (correspondente a um motor de combustão de 20hp), três conjuntos de
baterias com capacidade para armazenar 47 kW e 22 placas fotovoltaicas
instaladas na cobertura da embarcação. Com 12m de comprimento, 6m de largura e
72cm de calado (parte que fica na linha d’água), a embarcação tem ainda uma
autonomia de 8h, sem a necessidade de receber carga.
Para que seja um projeto
sustentável, um posto de recarga foi instalado no píer do campus e utilizará a
energia elétrica produzida pelas duas mini usinas construídas na universidade.
O estudo para desenvolver o SIMA
começou em 2019, envolveu cerca de 30 pesquisadores, professores e alunos da
UFPA e faz parte de um projeto de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PDI) da
Norte Energia, regulado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL).
O projeto estrutural do casco, em
alumínio naval, precisou considerar o peso adicional do sistema de baterias e
motores elétricos, além de sua aplicabilidade nos rios amazônicos. Isso porque
o barco pesa 7 toneladas, sendo uma tonelada somente de baterias.
“Este barco é o resultado de uma
parceria da UFPA com a Norte Energia, e para nós, enquanto universidade, ele é
também um laboratório, já que é o primeiro barco elétrico do nosso estado. Para
uma instituição que produz ciência, com a UFPA, esses equipamentos são uma
conquista para a sociedade. Nossa expectativa é que esse projeto estimule o
desenvolvimento de novos veículos, e que em pouco tempo de 10% a 20% dos barcos
da nossa região passem a ser movidos por energia limpa,” afirma o vice-reitor
da UFPA, Gilmar Pereira da Silva.
Responsável por liderar o projeto
pela instituição, o professor Emannuel Loureiro, pesquisador e Diretor da
Faculdade de Engenharia Naval da UFPA, ressalta os desafios de construir o
Poraquê. “O maior desafio foi encontrar tecnologias disponíveis no mercado que
conversassem entre si e atendessem a algumas premissas, como o peso da
embarcação, autonomia, velocidade e capacidade de transporte. O barco conta
também com centro de comando para o gerenciamento da energia fornecida pelas
baterias e pelo sistema fotovoltaico aos motores elétricos, conforme a potência
demandada para a locomoção da embarcação,” explica.
O Poraquê tem capacidade para
transportar 25 passageiros e dois tripulantes e conta com espaço para
cadeirantes, com plataformas de acesso nos três pontos de embarque e
desembarque. A expectativa é de que a embarcação atenda mil passageiros por
dia, entre estudantes, funcionários da universidade e pessoas que utilizam os
serviços da instituição.
A previsão é que navegue por 750
metros do Rio Guamá, em um percurso com três paradas: no edifício Mirante do
Rio, nos restaurantes universitários e no setor de saúde da UFPA. A travessia
irá durar 15 minutos e, ao final do dia, o barco terá percorrido 40 Km, a uma
velocidade média de 13 Km/h.
Mobilidade elétrica urbana na
Amazônia
Além de circular dentro do campus
da UFPA, atualmente, os dois ônibus elétricos transportam professores e
estudantes da capital ao campus Castanhal, formando o primeiro corredor verde
da Amazônia. A bateria dos coletivos é carregada em estações de recarga
elétrica instaladas nos dois campos.
O SIMA também inclui o aplicativo
Norte Rotas, em que o usuário tem informações em tempo real para planejar seu
deslocamento de ônibus ou de barco. O projeto contemplou, ainda, a implantação
de um sistema fotovoltaico no edifício Mirante do Rio, para atender parte da
demanda de energia do prédio, buscando autossuficiência ao configurá-lo como um
Edifício “Zero Energy”.