
SEM USO: A ponte está pronta mas os acessos não foram construídos e os usuários precisam pagar pela balsa (Foto: Divulgação/Dnit) (Foto: )
Após a queda da ponte sobre o Rio Tocantins, na
BR-226/TO/MA, e polêmica sobre a lisura da contratação da obra sem licitação, o
Estradas apurou que o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes
(DNIT) investiu até agora R$ 233 milhões para construir uma ponte na rodovia
BR-153, entre São Geraldo do Araguaia (PA) e Xambioá (TO), mas que não pode ser
liberada ao tráfego por falta de acesso.
Apesar da ponte estar praticamente pronta, os acessos que
permitem liberá-la para uso, segundo a nota que recebemos do DNIT, estão com
apenas 2,2% das obras executadas.
Moradores revelam que faltam construir as duas rampas de
acesso às extremidades da ponte, tanto no lado do Tocantins quanto no lado do
Pará. Os acessos ficaram a cargo da Teto Construtora S.A.
(Veja vídeo extraído do perfil no Instagram de Claudemir
Travain)
O consórcio responsável pela execução da ponte é formado
pelas empresas A. Gaspar, Arteleste e V. Garambone. As duas primeiras
envolvidas na polêmica da ponte da BR-226, cuja reconstrução será sem
licitação.
Segundo o DNIT, o órgão “aguarda as tratativas das
desapropriações dos imóveis afetados”. Enquanto isso, os usuários podem ver a
ponte pronta mas não tem como acessá-la. E não há condições de prever quando
isso de fato vai ocorrer. Até porque os prazos que o governo tem anunciado não
são cumpridos.
Segundo matéria do Jornal do Tocantins, somente no final de
outubro passado foi desapropriado terreno para a construção do acesso naquele
estado. Lembrando que a ordem de serviço para a construção da ponte foi
publicada em 14 de dezembro de 2017, portanto, há mais de sete anos.
A Reportagem também apurou que a
Secretaria de Comunicação do Governo Federal publicou matéria, em 19 de
julho de 2024, informando que a ponte seria liberada ao tráfego, conforme
consta em parte do texto “… A previsão de conclusão da obra da ponte é
setembro/2024 e até outubro/2024 a passagem terá trafegabilidade. Os acessos
têm previsão de conclusão em Julho/2025. Até o momento, foram investidos nas
obras R$ 215.350.690,05.”
Já em 27 de agosto de 2024, a Agência de Notícias do Governo
informava: “As obras de construção da estrutura da ponte já estão 99%
concluídas. ….Com as obras dos acessos já iniciadas, ela ganhará
trafegabilidade já em novembro de 2024, através da rampa de acesso, que será
liberada para os veículos”.
Apenas 38 dias depois da notícia de 19 de julho, as
despesas já passaram de R$ 215 milhões para R$233 milhões.
Pela média foram R$ 485 mil por dia de acréscimo entre 19 de
julho e 27 de agosto de 2024. Embora esse não seja o método mais preciso para
calcular os gastos, já se passaram mais de 100 dias desde a última atualização
oficial, e tudo indica que os custos aumentaram significativamente.
Algumas pessoas que acompanham a obra desde o início, que
não quiseram ser identificadas, acreditam que a demora pode ser por questões
políticas. “A ponte é muito importante para a região e transporte de cargas. Eu
não quero saber quem começou ou terminou. O dinheiro da obra sai do bolso do
povo. Estamos pagando a travessia pela balsa e a promessa é da ponte sem
pedágio. Só acredito vendo.”, explicou um morador que usa frequentemente a
travessia.
Histórico da obra
A construção da ponte sobre o Rio Araguaia, na BR-153, que
conecta São Geraldo do Araguaia a Xambioá, teve sua ordem de serviço assinada
em 14 de dezembro de 2017, durante o governo do então presidente Michel Temer.
No entanto, devido a disputas judiciais, as obras efetivas
começaram apenas em fevereiro de 2020, já na gestão Bolsonaro. Após o
Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) obter decisão
favorável para iniciar os serviços.
Atualmente, 99% dos serviços estão finalizados, mas não há
data para liberação ao tráfego pela falta de acesso já mencionada.
Ainda não foi possível entender porque o governo federal
contratou a construção de uma ponte dessa dimensão com um consórcio e outra
empresa para fazer os acessos. Alguns especialistas alegam que pode ter sido
para reduzir custos, com duas licitações diferentes.
Outros entendem que o ideal é apenas um consórcio construir
tudo, pelo risco de descoordenação entre as obras da ponte e dos acessos,
podendo levar a atrasos, o que de fato está ocorrendo. Além de potenciais
conflitos técnicos na integração entre a ponte e os acessos.
O fato é que os usuários tem a ponte mas não podem
utilizá-la e não há previsão confiável de quando isso poderá ocorrer.
Obra é essencial para reduzir custos de transporte
A ponte, com 1.727 metros de extensão, é uma demanda antiga
da população local e visa melhorar a integração entre os estados do Pará e
Tocantins, facilitando o escoamento de produção e reduzindo custos de
transporte.
Diante desse cenário, o Estradas entrou em contato com o
Ministério dos Transportes (MT) e pediu as seguintes explicações:
- Por
que a obra ainda não foi inaugurada? Qual o motivo, uma vez que já estava
certa a data para a liberação ao tráfego?
- Se o
governo federal já licitou em tempo recorde a construção de nova ponte
sobre a BR-226/TO/MA, por que então não finaliza completamente as obras da
ponte na BR-153/TO/PA, no trecho entre Xambioá (PA) e São Geraldo do
Araguaia (TO)?
- Qual
a empresa que está fazendo a travessia por balsa e qual o valor que o
Governo Federal paga à empresa por esse serviço?
Por meio de sua assessoria de imprensa, o Ministério dos
Transportes (MT) limitou-se a responder:
“As informações devem ser solicitadas ao Departamento
Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT)”
Por conta disso, a Reportagem procurou o DNIT para prestar
esclarecimentos. Por meio de sua assessoria de imprensa, a Autarquia respondeu:
“O DNIT informa que as obras de construção da ponte sobre
o Rio Araguaia na rodovia BR-153, entre os municípios de São Geraldo do
Araguaia (PA) e Xambioá (TO), foi subdividida em dois contratos distintos. Um
deles trata exclusivamente da ponte de concreto armado, que está ativo e com um
percentual de conclusão de 99,19%. Restam apenas os serviços de pavimentação
asfáltica e sinalização para sua conclusão. Entretanto, para a execução destes
serviços, faz-se necessária a execução dos aterros dos acessos à Ponte, os
quais estão sob a guarita do Contrato nº. 00658/2023-23, que trata dos acessos
à ponte e iluminação da mesma, que também está ativo e com percentual de
conclusão de 2,22%.
O DNIT aguarda as tratativas das desapropriações dos
imóveis afetados. As audiências judiciais das desapropriações deverão ocorrer
até março/2025. Além das desapropriações, outro fator que impacta a execução
das obras nesse momento é o período chuvoso, que impossibilita a execução de
serviços de drenagem e de terraplenagem.
As contratações/concessões deste tipo de transporte por
balsa são de responsabilidade da ANTAQ.”
Falta de planejamento, diz especialista
O Estradas consultou um especialista em obras de engenharia
rodoviária, com mais de 35 anos de experiência em grandes obras, mas prefere
não ser identificado. Na sua avalição o que ocorreu foi falta de planejamento
do DNIT. “Quando você faz uma obra dessas, no meu entendimento, o consórcio
deveria construir tudo para evitar atrasos de um terceiro. Não vejo
justificativa para construir uma ponte sobre o rio e não ter como acessá-la
para liberar o tráfego tanto tempo depois. Afinal, foram quase quatros anos construindo
a ponte que está 99% pronta e os acessos ainda estão em 2,2%, conforme o
próprio DNIT reconhece.”
Já o coordenador do SOS Estradas, Rodolfo Rizzotto, lembra
que não é engenheiro rodoviário mas compara a obra à construção de um prédio.
“Fizeram um belo edifício mas a entrada não existe e ainda precisa da
autorização dos donos do terreno para executar a obra. São sete anos e três
governos, com ideologias diferentes, para cuidar de uma ponte de 1.700 metros.
É por isso que o Brasil não anda. Em cinco anos a Índia construiu uma rodovia
de 1.300 quilômetros, com 4 faixas de rolamento em cada sentido, pontes e
viadutos e nós demoramos anos para 1,7km.”
Rizzotto lembra ainda de frase mencionada com frequência
entre os profissionais de Infraestrutura: O Brasil tem pressa de obras prontas!
“O problema é que não terminam as quase prontas”, acrescenta.
Fonte: Estadas.com.br