Uma das aldeias Xicrin do Cateté beneficiadas com o acordo bilionário até 2067 (Foto: )
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin
atendeu a um pedido do procurador-geral da República, Paulo Gonet, e suspendeu,
na última quinta-feira (16), pagamentos de honorários que podem chegar a R$ 233
milhões até 2067, a um advogado do sudeste do Pará, no âmbito de um acordo
entre a Vale e comunidades indígenas da etnia Xikrin que habitam a Terra
Indígena Cateté, em Parauapebas.
Firmado em novembro de 2020, o acordo entre a companhia e os
Xikrin, com participação do Ministério Público Federal (MPF), foi feito em
razão da atividade da mineradora no território indígena. O acerto prevê
pagamentos mensais que totalizarão R$ 2,3 bilhões até 2067. O dinheiro é
destinado a infraestrutura, despesas com saúde, alimentação, educação, cultura
e transporte das famílias indígenas, além da criação de um fundo para gerações
futuras das comunidades.
Gonet pediu ao STF a suspensão de uma decisão do Tribunal de
Justiça do Pará (TJPA), segundo a qual 10% das parcelas mensais repassadas pela
Vale às comunidades indígenas devem ser descontados e destinados ao advogado
José Diogo de Oliveira Lima. Ao final dos pagamentos do acordo, portanto, o
valor totalizaria R$ 233 milhões em honorários contratuais.
Oliveira Lima defendeu quatro associações Xikrin no âmbito
do acordo com a mineradora, mas teve sua procuração revogada antes da conclusão
do processo. O advogado foi aos tribunais para cobrar os honorários do
contrato, mas a Justiça paraense em primeira instância os limitou a um total de
R$ 3,3 milhões. O advogado recorreu ao TJPA com sucesso – segundo a decisão,
ele teria direito a 10% do valor total do acordo. Para os desembargadores do
tribunal, o montante de R$ 3,3 milhões é “muito inferior ao devido”.
Ao STF, Paulo Gonet argumentou, no entanto, que a justiça
estadual sequer tem competência para decidir nesse caso e que a decisão do TJPA
“coloca em risco a efetividade dos acordos firmados entre Ministério Público
Federal, Vale S/A e o povo indígena”.
“A retenção de valores para o pagamento de despesas
estranhas aos acordos firmados, no caso de honorários advocatícios contratuais,
e em percentual elevado, correspondente a 10% do valor global pactuado, coloca
em risco a própria efetividade dos instrumentos,” apontou o chefe da PGR.
Se os indígenas não receberem integralmente as verbas da
Vale para a aplicação prevista no acordo, disse o procurador-geral da
República, há risco de ressurgimento de “disputas e conflitos sociais
decorrentes das atividades mineradoras na área”.
Responsável pelo plantão do Supremo até o último domingo
(19), Fachin atendeu à PGR nessa quinta, com uma decisão liminar. Escreveu o
ministro em seu despacho, que suspende o acórdão do Tribunal de Justiça do
Pará:
“Quanto ao mérito, ainda que não pertinente de análise
nesta instância, constata-se que presente o risco de grave lesão à segurança
pública, considerando a ameaça do iminente recrudescimento de conflitos
consectários das atividades mineradoras na área em função da ausência do
repasse integral dos valores pactuados com aplicação em objetivo diverso do
pactuado no acordo firmado no bojo das Ações Civis Públicas”.
A decisão de Edson Fachin será submetida a julgamento
colegiado no plenário virtual do Supremo, entre os dias 14 e 21 de fevereiro.
Ao Blog do Zé Dudu, José Diogo de Oliveira Lima enviou a
seguinte nota:
“Um advogado que representou as associações indígenas
Xikrin durante sete anos está a processá-las pela resilição unilateral e
imotivada dos contratos de prestação de serviços, ocorrida no dia do acordo
bilionário. O advogado, contratado com uma cláusula de êxito de 10%, trabalhou
em diversas ações coletivas contra grandes projetos de mineração da empresa
Vale S/A, conseguindo significativas vitórias em prol das comunidades
indígenas.
O trabalho do advogado resultou num acordo global com a
mineradora Vale S/A, que garante aos Xikrin uma compensação financeira de 7,5
milhões de reais por mês até 2067.
Apesar do sucesso alcançado e dos benefícios financeiros
para as associações, o advogado foi dispensado abruptamente, no dia de
audiência de conciliação, e não recebeu os honorários devidos, essenciais para
a sua subsistência.
Enquanto as associações indígenas estão ostentando o modo
de vida e se beneficiando de um total de R$ 2,3 bilhões ao longo das próximas
décadas, o advogado tenta receber seus honorários que possuem natureza
alimentar. O caso está a gerar debate sobre a proteção dos direitos dos
advogados e a importância de honrar os acordos contratuais estabelecidos.
O Tribunal de Justiça do Pará reconheceu o direito do
advogado aos honorários convencionados, determinando descontos de 10% sobre os
pagamentos mensais da Vale S.A., com a expressa determinação de depósitos em
juízo. A decisão do Ministro Edson Fachin foi considerada omissa e contrária à
legislação processual, além de violar prerrogativas constitucionais do
advogado”.