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Mais da metade do funcionalismo público municipal
no Pará poderá viver a pão e água até 2036, quando, enfim, cessarem os efeitos
da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 186/2019, que permitiu o retorno do
auxílio emergencial à custa de, entre outros fatores, suspensão de reajustes
salariais dos servidores de todos os poderes, em todas as esferas. A proposta,
que já foi promulgada no Congresso, abre caminho para que 80,5% das prefeituras
paraenses congelem salários por até 15 anos, isto é, até 2036.
As informações foram levantadas pelo Blog do Zé
Dudu, que se debruçou sobre as contas públicas consolidadas em 2020 por 67
prefeituras paraenses que entregaram seus balanços ao Tesouro Nacional e
constatou que muitas delas, já estranguladas, mal terão condições de pagar os
atuais salários e muitas outras caminham para a inviabilidade total.
Entre os servidores públicos, a PEC Emergencial, no
jargão do Governo Federal, é tratada como “PEC da Chantagem” porque os
governistas jogaram nas costas do funcionalismo o peso de conceder (ou não) uma
nova rodada de auxílio emergencial à parcela da população prejudicada pelos
efeitos das restrições de saúde pública para tentar conter o avanço do
coronavírus, que veio mais agressivo e letal na atual segunda onda. Para garantir
o auxílio, o Governo Federal exigiu como contrapartida ajuste fiscal nas
contas, tendo como alvo a contenção de despesas com pessoal.
O problema é que a estratégia utilizada para conter
a despesa com a folha dos governos é bastante agressiva, principalmente para
municípios com pouca capacidade financeira e dependentes de transferências
constitucionais. Porém, a PEC quer evitar que os gestores se lancem a medidas
populistas, fazendo cortesia com chapéu alheio, isto é, concedendo reajustes
salariais lançando mão de recursos vindos de transferências.
Situação crítica
Serão barrados de fazer mimos e agrados ao
funcionalismo estados e municípios onde a despesa corroer a partir de 95% da
receita corrente. Nesse cenário, o Blog do Zé Dudu avaliou que 18 de um
universo de 67 municípios do Pará com contas entregues já não têm condições
alguma de sequer pensar em reajuste porque já comprometem quase toda, toda ou
até mais que toda a arrecadação com despesas de toda sorte.
É o caso de um grupo de sete prefeituras que
reportaram ter gasto muito mais que o que arrecadaram no ano passado inteiro,
um claro sinal de falência fiscal. Em Jacundá, Abel Figueiredo, Bom Jesus do
Tocantins, Tracuateua, Sapucaia, Pau D’Arco e Nova Ipixuna, as despesas
superaram absurdos 100% das receitas correntes. Curiosamente, seis entre esses
sete municípios estão no sudeste do Pará.
A situação mais grave é a de Jacundá, que registrou
receita de R$ 100,81 milhões e despesa de R$ 110,92 milhões. Naquele município,
onde 87% do que se arrecada vêm dos governos estadual e federal, reajuste
salarial poderá causar muito embaraço ao prefeito de agora para frente. Não há
condições legais para fazer isso até que as despesas consigam baixar a menos de
95% da receita, preferencialmente baixar à margem de segurança inferior a 85%
da arrecadação, uma vez que a PEC autoriza o chefe do Poder Executivo a entrar
em ação, com medidas de contenção de gastos, já com 85% da arrecadação
comprometidos.
Assim, um universo ainda maior de prefeituras
paraenses — 80,5% — já têm respaldo para vencer queda de braço salarial com
categoriais de servidores. É o caso dos municípios de Belém, onde a despesa
sugou 86,56% da receita, Redenção (87,92%), Barcarena (88,8%) e Novo
Repartimento (88,99%). Eles são municípios muito ricos, com arrecadação
superior a R$ 200 milhões, mas que também gastam muito.
Os confortáveis
Há, porém, um seletíssimo grupo de “iluminados” —
13 municípios no total — que conseguem gastar bem menos que o que arrecadam e
que poderão seguir com todas as possibilidades do mundo favoráveis aos
funcionalismo público local. São municípios ou com arrecadação robusta ou com
elevada eficiência de gastos com pessoal, para os quais a PEC da Chantagem não
faz sequer cócegas.
Fazem parte desse grupo sete das 12 prefeituras
mais ricas do Pará, sendo que Canaã tem, disparado, a situação mais confortável
porque, ano passado, gastou apenas 48,42% do que arrecadou. Hoje, se quisesse
dobrar os salários de todos os seus servidores públicos municipais, a
Prefeitura de Canaã dos Carajás conseguiria fazê-lo sem afrontar a Lei de
Responsabilidade Fiscal (LRF). No entanto, apesar de ter muito dinheiro, isso
não é possível legalmente porque a maior parte da receita local advém da
Compensação Financeira pela Exploração Mineral (Cfem), recurso que, pela lei
que a criou, não pode ser usado para pagar servidores.
Outro com situação financeira bastante confortável
é Marabá, onde as despesas consomem apenas 69,08% das receitas. Se o gestor
municipal quiser reajustar salários, poderá fazê-lo sem afrontar a PEC. Também
terão carta branca para reajuste os servidores da Prefeitura de Parauapebas,
onde a despesa representa 70,54% da receita, muito abaixo da linha de tiro da
PEC da Chantagem. Em Itaituba (76,59%), Paragominas (77,83%), Santarém (82,23%)
e Ananindeua (84,2%), os servidores também poderão pressionar por aumentos, e
os gestores não poderão usar as imposições e vedações da PEC 186/19 para negar.
Confira o levantamento exclusivo do Blog do Zé Dudu
que mostra a situação dos municípios do estado, com contas entregues, perante
as vedações da PEC 186/19!