A S11D, uma das principais minas da Vale, fica no estado do Pará (Foto: Sérgio Castro) (Foto: )
Brasília – O governador
do Pará, Helder Barbalho (MDB), assinou um decreto no início de março
triplicando as alíquotas relativas à extração de produtos como níquel, cobre e
minério de ferro. Segundo o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), o
decreto é inconstitucional.
A mineradora Vale é a principal companhia
exploradora das commodities elencadas no decreto estadual. A
título de comparação, levando em conta a produção da Vale no estado em 2020, de
192,3 milhões de toneladas, o pagamento do tributo pela mineradora triplicaria
com a nova taxa, saindo de R$ 717 milhões para R$ 2,2 bilhões por ano. A Vale
teve lucro de R$ 4,8 bilhões.
De acordo com o novo decreto, para o minério de ferro
– principal commodity explorada pela Vale no Pará –, a taxa
saiu de 1 para 3 Unidades de Padrão Fiscal – UPF-PA, cotada a R$ 3,7292 por
tonelada.
A Vale não quis se manifestar e explicar se vai
judicializar a questão, o que parece ser o único caminho a seguir, dada a
posição manifestada pelo Instituto Brasileiro de Mineração.
O Ibram “recebeu com surpresa” a alteração das
alíquotas pelo governo do Pará, afirmando que “a taxa é inconstitucional e que
não houve qualquer alteração nas operações que justificasse a elevação do valor
cobrado”. O instituto explica que a legislação estadual vigente determina que a
alteração das alíquotas só poderia acontecer em 2031. Assim, a alta não poderia
incidir em 2021, já que é inconstitucional cobrar aumento de tributo no mesmo
exercício financeiro.
Em 2012, ano seguinte à criação da taxa, a Vale
chegou a registrar uma provisão de R$ 294 milhões no balanço do terceiro
trimestre, relativa ao pagamento. Logo em seguida, chegou a um acordo com o
governo do Pará, que reduziu o valor cobrado a um terço. No formulário 20-F
deste ano, enviado ao órgão regulador do mercado americano, a Vale diz que
vários estados brasileiros, incluindo Minas Gerais, Pará e Mato Grosso do Sul,
impõem a TFRM sobre a produção mineral.
Retaliação
O governo do Pará também não se manifestou sobre o
aumento da taxa, mas fontes apontam que está relacionado a uma forte
insatisfação do governo Helder Barbalho com a Vale.
Há anos o governo local pressiona a companhia por
uma verticalização da cadeia mineral. Em 2019, a empresa assinou um protocolo
de intenções para apoiar a estruturação financeira de uma laminadora de aço em
Marabá pela China Communication Construction Company, mas o projeto
não saiu do papel. Há ainda a expectativa de instalação no estado de uma
unidade da Tecnored, produtora de ferro-gusa de baixo carbono (gusa
“verde”).
No dia 26 de março, o procurador-geral do estado do
Pará, Ricardo Sefer, criticou a Vale em transmissão ao vivo organizada no
Instagram pelo jurista e presidente do PSD no Pará, Helenilson Pontes. “A visão
que o governo [do Pará] tem da Vale é muito ruim. É uma empresa que muito tira
e pouco deixa,” disse. A companhia extrai quase dois terços de seu minério de
ferro em solo paraense e foi beneficiada por décadas com isenções impostas pela
Lei Kandir, que desonera os produtos do portfólio da mineradora.
Um dos criadores da TFRM em 2011, Pontes é
especialista em tributação e livre docente da matéria na USP. Ele defende que a
taxa é vinculada ao poder de polícia do estado, que não se esgota com a
fiscalização. “É o poder de atuar em todas as esferas impactadas pela atividade
mineral,” afirma. A Constituição, diz o jurista, admite taxas de serviço e de
poder de polícia, caso da taxa mineral. Ele defende que os recursos arrecadados
podem ser destinados a investimentos públicos em Saúde, Educação, Saneamento e
outras áreas sociais, desde que para mitigar efeitos nocivos da mineração.
Mistério
O decreto foi assinado semanas antes do novo
secretário de Desenvolvimento Econômico, Mineração e Energia (Sedeme),
funcionário da Vale, José Fernando Junior assumir a pasta. O executivo presidia
o Sindicato das Indústrias Minerais do Estado do Pará (Simineral), que reúne as
indústrias do setor. Entretanto, para pessoas próximas, Fernando disse que
deixou a Vale.
Questionada, a Sedeme respondeu que o decreto nº
1.353, que elevou a taxa, deve ser cumprido por todas as empresas mineradoras
do estado do Pará. O motivo do aumento, afirma, é o alto custo de fiscalização
do setor. Segundo a secretaria, o intenso tráfego de minério para o Porto de
Vila do Conde gera um alto custo de manutenção das estradas.
POR VAL-ANDRÉ MUTRAN
– DE BRASÍLIA/ ZE DUDU