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Se a legislação ambiental não for flexibilizada e a
mineradora multinacional Vale não conseguir avançar com sua produção entre
florestas e cavernas de importância biológica na Serra Norte de Carajás, a
extração de minério de ferro em Parauapebas poderá ser encerrada em 2037. E
não, não é o Blog do Zé Dudu quem está dizendo. É a própria mineradora que
reconhece o fato em seu gigantesco relatório de 213 páginas entregue
recentemente à Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos, onde a
poderosa multinacional tem ações na Bolsa de Nova Iorque.
As informações foram levantadas com exclusividade
pelo Blog do Zé Dudu, que acessou a íntegra do balanço encaminhado no dia 23 de
março à CVM norte-americana e cuja data-base, 31 de dezembro de 2020, traz a retrospectiva
da atuação da Vale no Brasil e no mundo, com o detalhamento significativo de
seus projetos.
Mesmo que sejam consideradas para cálculo de
vida-útil jazidas da Vale ainda não tocadas em Parauapebas, como N1 e N2,
mantidos o ritmo e a qualidade de exploração mineral, a extração sobreviverá 17
anos. Mas a empresa trabalha com “pelo menos 17 anos” porque acredita que, até
2037, poderá haver luz no fim do túnel.
10
anos em apenas 1
No balanço referente ao exercício de 2019, a Vale
estimou que haveria minério em Parauapebas suficiente para exploração comercial
até 2047, considerando-se as minas N3, N4W, N4E e N5 e os projetos N1 e N2. Por
que, então, de um ano para outro, a estimativa foi reduzida em dez anos? A
própria Vale explica.
“Consistentemente com a regulação ambiental
corrente para cavidades e o avanço dos estudos de caracterização, estamos
reduzindo nossas reservas em aproximadamente 2,2 bilhões de toneladas, das
quais aproximadamente 939 milhões no Sistema Norte e o restante nos Sistemas
Sul e Sudeste”. O Sistema Norte de produção compreende as reservas da Serra
Norte, em Parauapebas; da Serra Sul, em Canaã dos Carajás; e da Serra Leste, em
Curionópolis. A mineradora diminuiu a expectativa de vida para as reservas de
Parauapebas e Curionópolis e esticou a de Canaã dos Carajás, que será a grande
vedete da mineração a partir do final desta década.
“Esta redução poderá ser revertida no futuro,
dependendo de mudanças na legislação e o aprofundamento de nosso conhecimento
destas cavidades, que podem ter seu nível de relevância reclassificado para
tipos que podem ser suprimidos ou compensados em outra localidade”, reconhece a
empresa no balanço.
De acordo com a Vale, as reservas minerais para o
Sistema Norte foram impactadas principalmente por restrições relacionadas às
cavidades, embora a diminuição do potencial tenha sido parcialmente compensada
por aumento decorrente de incorporação de novas informações geológicas para
S11D. “A data de exaustão projetada para o complexo Serra Sul foi prorrogada e
reduzida para as operações Serra Norte e Serra Leste”, confirma a
multinacional, fazendo um parêntese sobre a situação de Parauapebas: “Apesar de
reduzir as reservas associadas às cavidades, temos no complexo Serra Norte
reservas suficientes para pelo menos 17 anos de produção no mesmo ritmo e
qualidade”.
Números
consolidados
De acordo com a Vale, há disponível — medido,
provado e provável — no complexo minerador de Carajás 14,444 bilhões de
toneladas de minério de ferro. Essa era a situação encontrada até 31 de
dezembro de 2020. Até o final de 2019, eram 16,118 bilhões de toneladas — e
essa drástica diminuição é derivada das questões já expostas, por consequência
do arrocho da legislação ambiental sobre as reservas e a produção.
Parauapebas iniciou este ano com 1,717 bilhão de
toneladas de minério, com duração até 2037. Curionópolis tem reserva estimada
em 260 milhões de toneladas, com perspectiva de exploração comercial até 2048.
Em Canaã dos Carajás estão todas as apostas da mineradora Vale. O potencial
mineral total debaixo do subsolo do município é desconhecido, mas o que há
apenas nos blocos C e D do corpo S11 é de 4,43 bilhões de toneladas de minério
de ferro da mais elevada pureza, duas vezes e meia mais que em Parauapebas. Por
isso, a empresa estima que a lavra desses corpos irá até 2058.
Como a atividade mineradora é base econômica desses
municípios, os governos locais precisam começar a traçar planos de
sustentabilidade para enfrentar o fim do ciclo. Em Parauapebas, cujas finanças
públicas são mais sensíveis e para quem a exaustão das minas é temporalmente
mais próxima, a implantação de novos modais econômicos é gritante. Em 2020, dos
R$ 2,07 bilhões brutos arrecadados pela administração local, R$ 1,5 bilhão
foram derivados da mineração, entre compensações financeiras, taxas e impostos.
Hoje, sem mineração ativa, Parauapebas é um
município financeiramente inviável porque sua arrecadação natural, sem o “plus”
da lavra mineral, não consegue sequer pagar 75% da atual folha de pagamento, de
quase R$ 700 milhões por ano. Mas há quem duvide de tudo isso, seja cético ou
relaxe e jure que o minério nunca vá acabar, o que é um comportamento perigoso,
sobretudo do ponto de vista da implementação de políticas públicas.