Senador Beto Faro (PT-PA) comandou o debate com Aloizio Mercadante, presidente do BNDES (Foto: )
Brasília – O presidente do Banco Nacional
de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Aloizio Mercadante, afirmou em
audiência pública que a Coalizão Verde trabalha com a perspectiva de se chegar
a uma proposta de R$ 100 bilhões de crédito especial para a Amazônia. Durante o
debate, realizado pela Comissão de Meio Ambiente (CMA) do Senado nesta
terça-feira (31), os congressistas destacaram a regularização fundiária dos
pequenos e médios produtores como uma das ações mais importantes para a redução
da desigualdade na região. A audiência foi requerida pelo senador Beto Faro
(PT-PA), que presidiu a reunião.
A carta de
intenções do Pró-Amazônia, chamada de Coalizão Verde, abrange esforços pela
concretização dos propósitos da Cúpula da Amazônia, realizada no mês de agosto,
em Belém. O BNDES, em conjunto com o Banco Interamericano de Desenvolvimento
(BID), o Banco Mundial e outras 19 instituições financeiras dos países
amazônicos, articulou a iniciativa para a criação de linhas de financiamento
destinadas ao desenvolvimento sustentável da região. Até agora, foi anunciado o
valor de R$ 4,5 bilhões para operações de crédito com microempreendedores
individuais e micro, pequenas e médias empresas da região.
“É o
momento histórico da Amazônia. É o momento em que a Amazônia tem que se colocar
ao mundo, tem que saber que isso é um ativo para o Brasil para atrair
investimentos e para cobrar compensações alternativas. E eu concordo que os
países ricos não cumpriram o que prometeram. Eles tinham prometido U$$ 100
bilhões e não entregaram. Nunca entregaram. O próprio Fundo Amazônia é muito
importante, é não reembolsável, mas é pequeno. Então nós precisamos chegar com
propostas ousadas. A ideia da Coalizão Verde ao trazer o Banco Mundial e o BID
é exatamente para isso,” enfatizou ele.
E
antecipou: “Eu não posso dizer isso oficialmente porque nós não fechamos, nós
estamos numa construção, todos os bancos estão consultando, mas a nossa
perspectiva é de chegarmos com uma proposta de R$ 100 bilhões de crédito
especial para a Amazônia, de crédito favorecido para a Amazônia”.
Parte dos
senadores concordou com Mercadante e defendeu a posição do Brasil de
reivindicar uma contrapartida mundial em função da mudança climática frente ao
papel da Amazônia e das ações de preservação e comprometimento com uma
transição energética sustentável.
“Eu acho
que o presidente Lula abraçou profundamente e definitivamente [a pauta verde],
não entendendo a pauta verde como uma pauta ambiental, de transição, mas uma
pauta da economia. É disso que se trata. Óbvio que ninguém vai fazer transição
energética da noite para o dia, nem em cinco ou dez anos, acho que esse é um
processo mais prolongado, mas creio que o Brasil está se colocando na
dianteira, seja nos ônibus elétricos, seja nos carros elétricos que estão
chegando no estado da Bahia e vão chegar a outros estados também,” reforçou o
líder do governo, senador Jaques Wagner (PT-BA).
Oportunidades
Na
avaliação de Mercadante, o Brasil vive hoje uma “janela histórica de
oportunidades” ao concentrar, diante de um mundo de guerras e tragédias
humanitárias, de transformações digitais, impactos ambientais severos e
reorganização da economia global, uma posição estratégia de segurança, de
pacificação e retorno da estabilidade econômica. O país, segundo ele, coloca-se
ainda como liderança nesse cenário por possuir a melhor matriz energética
limpa, um cenário de estabilidade diplomática e a maior matriz energética do
mundo.
“Nós
estamos com o mundo inteiro começando a produzir hidrogênio verde, nós temos
uma matriz que vai impulsionar o hidrogênio verde e do hidrogênio verde nós
vamos para o combustível sintético. Tanto a gasolina como o querosene de
aviação, como combustíveis de navios como o diesel, tudo isso vai ser
substituído pelo hidrogênio sintético que tem como base o hidrogênio verde, que
é o próximo salto da matriz energética renovável e limpa,” afirmou.
O
presidente do BNDES informou ainda que a demanda de crédito no BNDES na região
da Amazônia Legal aumentou 204%, com o crescimento de 40% na aprovação do
crédito. Já em relação à iniciativa privada, a instituição liberou, até
setembro, R$ 10 bilhões, frente aos R$ 8,2 bilhões destinados em 2022. Outra
ação importante para impulsionar o desenvolvimento na região foi a aprovação,
pelo Congresso Nacional, da Taxa Referencial de Juros para a inovação em 2% ao
ano. Em 2023, o banco está destinando R$ 5 bilhões para essa linha.
COP-30 no Pará
Mercadante
ainda ressaltou que a prioridade do BNDES na Amazônia é pensar em políticas
públicas que promovam de forma sustentável o desenvolvimento das mais de 28
milhões de pessoas que moram nos estados da região. Ele citou algumas linhas de
financiamento já aprovadas para garantir um legado na infraestrutura logística
de algumas localidades, como em Belém, que vai sediar a Conferência do Clima
das Nações Unidas (COP-30), em 2025.
“Já
anunciamos para os governos dos estados da Amazônia R$ 6 bilhões em
financiamento aprovados e que já estão em fase de contratação. E no caso do
Pará, R$ 3,2 bilhões já foram aprovados para a preparação da COP. Então, o que
nós estamos financiando são projetos estruturantes, projetos que vão deixar
legados. Por exemplo, a macrodrenagem na região das baixadas, que lá são
regiões mais carentes, projetos de infraestrutura para atender a toda a parte
logística da cidade,” disse.
Ainda de
acordo com ele, o esforço da Coalizão Verde é no sentido de que novas linhas de
financiamento, como os R$ 100 bilhões previstos, sejam anunciadas na COP-28,
que acontece em Dubai, entre os dias 30 de novembro e 12 de dezembro deste ano.
Regularização fundiária
Apesar de
reconhecer o papel do BNDES à frente desses diálogos e articulações, alguns
senadores lamentaram o fato de que muitos acordos internacionais protocolados
nas COPs não são cumpridos, e que o Brasil, muitas vezes, acaba saindo
prejudicado. Foi o caso dos senadores Mauro Carvalho (União-MT), Zequinha
Marinho (Podemos-PA) e Jaime Barattoli (PL-RO). Para eles, um dos grandes
gargalos que impede o desenvolvimento da região e de atividades econômicas
sustentáveis foi a questão da falta de regularização fundiária.
“O banco
quando quer financiar alguém, a primeira coisa que ele pergunta é sobre o
documento da terra. Pense na possibilidade de o BNDES colocar um recurso, até
mesmo sem retorno, porque o retorno vai vir de outra forma, com o
desenvolvimento da Amazônia sustentável e assim por diante. O Pará só não
avança mais pela dificuldade que tem de documento de terra,” disse Marinho.
Barattoli
reforçou o pedido ao alertar que a maior dignidade a ser concedida à população
amazônida é o título de terra e as garantias para que os moradores possam
produzir e viver do seu próprio trabalho.
“Existe
algo de errado nesses programas que se vêem há anos. Nós somos deficitários em
rede sanitária, praticamente zero, água tratada praticamente muito pouca, e nós
vemos a cada ano crescer a pobreza na Amazônia. E temos mais da metade do
território nacional com a maior riqueza que a natureza nos deu e o nosso povo,
quase 30 milhões de pessoas, a maioria vivendo na miséria,” salientou o
senador.
O
presidente do BNDES concordou com os parlamentares ao ressaltar que é possível
incentivar uma produção sustentável de acordo com o Código Florestal (Lei
12.651, de 2012) e com as exigências do mercado internacional que, segundo ele,
tem buscado cada vez mais um produto que não esteja ligado a uma cadeia de
desmatamento.
Para
Mercadante, em vez de parte da sociedade estimular críticas ao Fundo Amazônia,
a saída seria enxergá-lo como uma possibilidade para buscar a regularização
fundiária como alternativa para reduzir a desigualdade na região.
“O Fundo
Amazônia regularizou a situação do CAR [Cadastro Ambiental Rural] de 1,1 milhão
de propriedades. E tem vários projetos no Fundo Amazônia, projetos regionais,
para acelerar a regularização, especialmente a dos pequenos. Acho que é um
ótimo caminho para o Fundo Amazônia, que nós podemos apoiar e dar prioridade,”
disse, ao defender também uma taxa de juros menor para esse público no fomento
ao cooperativismo na região. Para ele, as duas ações vão ampliar a capacidade
de contratação de crédito e da produção local.
Por Val-André Mutran – de Brasília