Complexo da sede do Bradesco, Cidade de Deus, Osasco (SP) (Foto: )
Um ditado
popular antigo é a melhor definição para se entender o que está acontecendo com
as finanças do maior banco privado do Brasil, entre os anos 1960 e 2008,
“dinheiro não leva desaforo para casa”. O lucro do Brasdesco, fundado em
Marília (SP), em 1943, pelo lendário banqueiro Amador Aguiar, reportou prejuízo
bilionário pelo segundo ano consecutivo, mudou o presidente e anunciou um plano
de reestruturação. Vozes do mercado, no entanto, atribuem os prejuízos a um
fator vital: o banco não acompanhou a evolução (revolução) tecnológica abraçada
pelos concorrentes e ficou para trás com a continuidade de velhas práticas.
Na
quarta-feira (7), o Bradesco anunciou um lucro líquido recorrente de R$ 16,297
bilhões em 2023. O número é 21,2% menor que o registrado em 2022, quando o
resultado da companhia também encolheu 21%, para R$ 20,7 bilhões.
O resultado
veio abaixo das estimativas do mercado, de R$ 18,09 bilhões, segundo analistas
do mercado financeiro. A soma dos resultados acendeu um sinal de alerta
no board do Conselho de Administração, na Cidade de Deus, em
Osasco, no complexo sede do banco que passa por obras de reformas orçadas em R$
50 milhões. Desde 2023 o Bradesco começou um processo de reestruturação, sem
alarde para não gerar ruídos no mercado, mas com o balanço às claras, sabe-se
agora que o baque foi grande.
O balanço
também ficou aquém das previsões do próprio banco. “Não era o resultado que a
gente queria entregar”, afirmou Marcelo Noronha, presidente do Bradesco, em
entrevista a jornalistas para comentar os números.
Noronha
assumiu o banco em novembro, no lugar de Octavio de Lazari Junior, que ficou no
comando do banco por seis anos. A mudança de CEOs foi o pontapé inicial para a
reestruturação do banco, que enfrenta queda de rentabilidade desde 2022.
O ROE
(retorno recorrente sobre o patrimônio líquido médio anualizado), que indica a
rentabilidade da operação, ficou em 10% ao fim de dezembro de 2023, 3 pontos
percentuais abaixo do registrado ao fim de 2022 e o pior desde, pelo menos,
2007, ano inicial da série história disponibilizada pelo banco.
A queda no
lucro se deve ao aumento de 22,4% com despesas com PDD (provisão para devedores
duvidosos) e contração de 4,3% da margem financeira bruta com clientes.
Segundo o
presidente do Bradesco, o banco ainda arca com alta inadimplência gerada no
pós-pandemia visa melhorar a qualidade dos empréstimos concedidos, com um menor
apetite por risco. “Não vamos fazer nenhuma maluquice no crédito para entregar
resultado por entregar.”
“O nosso
desafio é o custo de servir com modelos adequados do custo de crédito. Mas uma
melhora mais expressiva só deve ser vista no segundo semestre, já como
resultado do aumento do volume de crédito e da margem”, afirmou Noronha. O novo
CEO admite problemas, disse que a reversão devem demorar um tempo e que serão
feitas trimestre, após trimestre.
A carteira
de crédito do Bradesco diminuiu 1,6% para R$ 877 bilhões, puxada pela redução
de 3,6% nos empréstimos a pessoas físicas.
A
inadimplência do banco segue alta na comparação com os pares, em 5,1%, mas em
queda desde o pico de 5,7% registrado no segundo trimestre.
O destaque
positivo, mais uma vez, foi a operação de seguros do Bradesco, a mais rentável
do grupo, com um ROE de 24,8%, 3,6 pontos percentuais maior que em 2022.
No ano
passado, o Bradesco Seguros teve um faturamento de R$ 106,6 bilhões (11,8%
maior) e lucro líquido de R$ 8,9 bilhões (32,2% maior).
Reestruturação
Para
recuperar a rentabilidade, o banco anunciou um plano de reestruturação, já em
andamento. Com o auxílio da consultoria McKinsey, o Bradesco cortou os cargos
executivos intermediários entre diretoria e presidência. Além de redução nos
custos, a mudança visa dar mais celeridade à tomada de decisões.
“2024 será
um ano de transição para nós. Vamos virar esse jogo”, afirma Noronha.
Outro foco
é a digitalização, com a contratação de 3 mil a 4 mil novos funcionários que
serão voltados para a estrutura digital do banco, que teve sua unidade de
negócios separada da vertical de varejo físico. O grande objetivo é reduzir
custos operacionais.
Cielo
Outra
mudança é na integração da Cielo, controlada pelo Bradesco em sociedade com o
Banco do Brasil, que irá fechar capital na Bolsa de Valores. A previsão do
banco é que a OPA (oferta pública de aquisição) para comprar as ações da
adquirente de outros investidores termine em 150 dias.
“Vamos
poder estabelecer metas diferentes [para a Cielo] de uma empresa que está
aberta, onde há conselheiros independentes, que respeitam determinados
princípios”, disse Noronha, ao comentar as vantagens da operação.
Outra
vantagem descrita pelo executivo é a flexibilidade no comando de empresas
fechadas, o que permitirá maior rapidez para realizar mudanças dentro da Cielo.
“O BB é um
bom parceiro, que nos dá escala. O acordo de acionistas vai mudar no meio do
ano, mas não vamos comprar ou vender a empresa, gostamos do sócio”, completou o
CEO.
Papéis na
Bolsa despencaram
Quando um
Titanic do mercado financeiro desvia mesmo que metros da rota traçada, o
efeito-dominó tem consequências. Com o balanço divulgado, as recomendações de
compra dos papéis do Bradesco feito pelas principais corretoras e Assets,
inverteram os sinais de compra de BBDC4 para venda. E as agências
de rating diminuem a nota de crédito da instituição.
O
decepcionante balanço do quarto trimestre de 2023 divulgado pelo Bradesco levou
o banco a perder mais de R$ 20 bilhões em valor de mercado na B3 — a Bolsa de
Valores do Brasil. No pregão de quarta-feira (7), suas ações registraram queda
de 15,90%.
O Bradesco
caiu várias posições no ranking que um dia liderou — entre os anos 60 e 2008,
quando o Itaú e o Unibanco se juntaram, foi o maior banco brasileiro sob
qualquer aspecto que se medisse. Com os números de hoje, passa a ser o quinto
maior banco em valor de mercado. Somente hoje foi ultrapassado pelo Banco do
Brasil e pelo BTG.
Ranking
Nome da Instituição
|
Valor de Mercado (Bilhões R$)
|
Itaú Unibanco
|
R$ 315 bilhões
|
Nubank
|
R$ 221 bilhões
|
Banco do Brasil (Estatal)
|
R$ 170 bilhões
|
BTG Pactual
|
R$ 144 bilhões
|
Bradesco
|
R$ 139 bilhões
|
Santander
|
R$ 110 bilhões
|
XP
|
R$ 68 bilhões
|
Pan
|
R$ 11 bilhões
|
Inter
|
R$ 10,5 bilhões
|
Banco do Nordeste
|
R$ 10 bilhões
|
Fonte:
Banco Central
Bradesco em
2023
Fundação: 1943, em Marília (SP)
Lucro líquido em 2023: R$ 16,3 bilhões
Agências: 2.695
Funcionários: 86,2 mil
Clientes: 71 milhões
* Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente
do Blog do Zé Dudu em Brasília.