21 de
março de 2022, 8h21
Ao receber verbas da União decorrentes de repasses
não feitos ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e
Básica (Fundef/Fundeb) via precatórios, estados e municípios não precisam
destinar 60% para pagamento de professores da educação básica.
Destinar aos professores 60% da complementação do Fundeb/Fundef pago em
precatórios desequilibraria o sistema
Reprodução
Essa foi a conclusão alcançada pelo Supremo
Tribunal Federal, que julgou improcedente a ação de descumprimento de preceito
fundamental ajuizada pelo Partido Social Cristão (PSC) contra um acórdão do
Tribunal de Contas de União.
Fundef e Fundeb são fundos compostos por
valores provenientes de impostos e transferências dos estados, municípios
e do Distrito Federal usados para financiar a educação pública. Por lei, uma
porcentagem desse montante deve ser destinada ao pagamento de professores.
O artigo 60 do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias ainda prevê que cabe à União complementar esses fundos quando, em
cada estado, município ou Distrito Federal, o valor por aluno não alcançar o
mínimo definido nacionalmente.
O problema é que, entre 1998 a 2006, a União
complementou essa verba de forma insuficiente. Esse erro de cálculo levou à
judicialização do caso, com condenação ao pagamento das diferenças, por meio de
precatórios.
Desvinculação foi admitida por acórdão do Tribunal de Contas da União em
2017Divulgação/TCU
Em 2017, o TCU concluiu que esse alto montante, a
ser recebido de uma só vez pelos entes federados, não precisa seguir a
subvinculação, com destinação de 60% para pagamento de professores, percentual
que estava previsto no artigo 22 da Lei 11.494/2007, vigente à época. Entendeu
que isso traria efeitos prejudiciais para a continuidade dos serviços de ensino
e para o equilíbrio financeiro dos municípios.
Ao STF, o PSC defendeu que o acórdão fez o oposto:
viola o direito fundamental à educação, à valorização dos profissionais da
educação escolar e ao piso salarial profissional nacional.
Relator, o ministro Alexandre de Moraes concluiu
que o caráter extraordinário do ingresso de verbas no Fundeb/Fundef via
precatórios justifica o afastamento da subvinculação, pois resultaria no
insustentável aumento salarial dos professores do ensino básico.
Em razão da regra da irredutibilidade salarial,
isso pressionaria o orçamento dos municípios nos períodos subsequentes, sem que
houvesse aumento de renda equivalente. Ao fim e ao cabo, isso reduziria
investimento em educação para custear os salários aumentados dos professores.
"De fato, o nível de gastos com pessoal
atingiria patamar não compatível com a realidade financeira do ente público,
uma vez o aporte de recursos via precatório, em razão do pagamento judicial das
diferenças nos repasses anteriores, é um fato isolado e não se repetirá nos
exercícios financeiros seguintes", afirmou o ministro.
Nesse ponto, a conclusão do relator foi acompanhada
à unanimidade pelos ministros do Supremo Tribunal Federal.
Relator, ministro Alexandre de Moraes manteve todas as conclusões do TCU
Carlos Moura/SCO/STF
Destaque de honorários
No mesmo acórdão atacado na ADPF, o TCU ainda fixou que os recursos provenientes
da complementação aos fundos educacionais devem ser utilizados exclusivamente
em ações de desenvolvimento e manutenção do ensino.
A corte de contas proibiu, portanto, a utilização
dos recursos alocados nos fundos educacionais para pagamento de honorários
advocatícios contratuais.
Esse foi o ponto que gerou divergência. Por
maioria, o entendimento do TCU foi mantido, conforme voto do ministro Alexandre
de Moraes.
Ele afirmou que o TCU procurou impedir a aplicação
dos recursos do fundo em fins diversos da manutenção e desenvolvimento da
educação, de modo a evitar o desvio de verbas constitucionalmente vinculadas.
"É inconstitucional, portanto, o pagamento de
honorários advocatícios contratuais com recursos alocados no Fundeb",
disse o relator. O que os entes federados podem fazer, por outro lado, é usar
somente a verba correspondente aos juros moratórios incidentes no valor do
precatório para quitar essa obrigação.
A posição do relator foi acompanhada pelos
ministros Dias Toffoli, Nunes Marques, André Mendonça, Edson Fachin, Luiz Fux,
Cármen Lúcia e Rosa Weber.
Para ministro Lewandowski, advogados que atuaram pelos municípios desde
o início poderiam receber pagamento de honorários
Gil Ferreira/Agência CNJ
Divergência vencida
Abriu a divergência o ministro Ricardo Lewandowski. Para ele, não seria
razoável negar aos advogados o destaque de honorários em recursos que só se
tornaram disponíveis para municípios, estados e Distrito Federal graças à sua
diligente atuação.
Assim, nas situações relacionadas à atuação de
advogados que ingressaram com ações de conhecimento individuais em favor de
dado município, seria legítimo o destaque do valor dos honorários advocatícios.
A medida só seria vedada aos advogados que atuaram
apenas na fase de execução de título judicial constituído em ação coletiva da
qual não participaram, pois isso sim afrontaria a correta destinação da verba
constitucionalmente vinculada à educação básica pública.