Presidente Lula na primeira reunião ministerial de seu governo (Foto: Ricardo Stuckert) (Foto: )
Brasília – O Blog
do Zé Dudu publicará uma série de reportagens especiais que vai revelar os
bastidores da maior preocupação do governo: os esforços da equipe do presidente
Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para garantir uma base de apoio na Câmara dos
Deputados e no Senado Federal. Há sinais de que haverá grande dificuldade na
aprovação de pelo menos cinco medidas provisórias encaminhadas entre janeiro e
fevereiro ao Congresso Nacional e que não foram bem recebidas, até por
congressistas que apoiam o governo.
No sistema presidencialista brasileiro, o Executivo
precisa de uma coalizão mínima para a aprovação de sua agenda no Congresso
Nacional. Reside aí o problema.
Ciente das adversidades, o próprio governo já
acenou com cargos no primeiro, segundo e terceiro escalão para quebrar a
resistência de partidos fisiológicos e que tem se mostrado refratários. Não se
importam quem é o governo da hora, mesmo assim o apetite se mostra maior do que
a oferta.
No ano passado, no curso da campanha política, a
experiência de Lula apontou um único caminho para derrotar a máquina do
governo: união. Foi construída, então, uma ampla frente de partidos. A
estratégia deu certo e, pela primeira vez na história, um Presidente da
República no cargo não conseguiu se reeleger, em mais um ineditismo que marcou,
até aqui, a carreira política de Jair Bolsonaro (PL) em sua rápida passagem
pelo Executivo.
Definido o novo presidente, Lula não consegue folga
nos números de apoio que precisa para governar. O mundo mudou desde suas
últimas passagens (2003 até 2006, e de 2007 até 2011): a direita veio para
ficar e hoje, diferente de ontem, não tem mais vergonha de escancarar sua
ideologia.
O primeiro capítulo do terceiro governo começa a se
desenhar com um teste de fogo do governo. A partir da próxima semana, uma série
de acontecimentos interconectados darão o tom de como será a relação do Palácio
do Planalto com o Palácio do Congresso. Uma relação que é o prenúncio de
sucesso ou fracasso do governo.
Como pano de fundo, cinco medidas com poder de
grandes estragos, como a detonação de uma banana de dinamite, vão testar quem
está e quem não está com o governo. As Medida Provisórias dos Combustíveis, da
Esplanada, da Funasa e do Carf, podem impor uma derrota histórica – o governo
sabe disso e corre para mudar o rumo. Não quer estrear com derrota.
Capítulo I
Nos capítulos que começam a ser escritos, a Comissão
de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) será uma das protagonistas. Com encontro
marcado para a próxima quinta-feira (16), às 8h, para definição dos trabalhos
iniciais do colegiado neste ano, a Medida Provisória nº 1.154/2023,
conhecida como MP da Esplanada, deve ser destaque na pauta dessa primeira
reunião de trabalho.
Senadora Soraya Thronicke (União-MS) será
presidente da Comissão de Agricultura e Reforma agrária (CRA) do Senado
Na última quarta (8), a senadora Soraya Thronicke
(União-MS) e o senador Efraim Filho (União-PB) foram eleitos, por aclamação,
para a presidência e vice-presidência da comissão.
A CRA tem 17 senadores membros titulares e 17
suplentes e lhe compete opinar sobre proposições pertinentes aos seguintes
temas:
- Planejamento;
- Direito agrário;
- Acompanhamento e execução
da política agrícola e fundiária;
- Agricultura;
- Pecuária e abastecimento;
- Agricultura familiar e
segurança alimentar;
- Silvicultura;
- Aquicultura e pesca;
- Comercialização e
fiscalização de produtos e insumos;
- Inspeção e fiscalização
de alimentos;
- Vigilância e defesa
sanitária animal e vegetal;
- Irrigação e drenagem;
- Uso e conservação do solo
na agricultura;
- Utilização e conservação,
na agricultura, dos recursos hídricos e genéticos;
- Extensão rural,
organização do ensino rural, entre outros temas.
A reunião será realizada na sala 13 da ala
Alexandre Costa, no Senado.
Na ocasião, Thronicke prometeu pautar os trabalhos
da CRA na busca da harmonia entre agronegócio e meio ambiente, e defendeu ainda
o enfrentamento da questão fundiária.
“Chega de demonizar o produtor rural, chega de
jogar uns contra os outros, e chega de batalhas ideológicas estéreis. Nós
podemos expandir o setor agropecuário e preservar o meio ambiente, podemos
exportar e alimentar o brasileiro, gerar emprego e renda no campo,” disse.
Embora o discurso para mitigar o claro antagonismo
entre produção x meio ambiente polarizado no Brasil seja protocolar, todos os
presidentes da CRA falam a mesma coisa quando tomam posse, mas na prática a
história é outra. Há uma guerra silenciosa entre gato e rato, onde o gato são
os ruralistas e o rato são os ambientalistas.
Há um outro detalhe: a senadora Soraya Thronicke é
membro da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA). Multipartidário e com 304
membros, é o mais poderoso colegiado do Congresso Nacional e defende o lado dos
gatos.
A informação é relevante porque está partindo da
FPA a articulação para derrubar a MP da Esplanada, um dos primeiros atos do
governo Lula, editada no primeiro dia de governo, quando começou a sua
tramitação após a publicação no Diário Oficial da União.
Mas por que a MP da Esplanada como é chamada,
preocupa o governo, uma vez que trata “apenas” de um assunto burocrático? Aí é
que mora o problema.
Conab e CAR
O texto da MP, que cuida da organização básica dos
órgãos da Presidência da República e dos Ministérios, embute um “jabuti”: a
transferência da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), do Ministério da
Agricultura para o Ministério do Desenvolvimento Agrário. Ao lerem a MP, os
congressistas ruralistas descobriram a “pegadinha” e ficaram furiosos.
Há senadores e deputados que acham que a decisão em
relação à Conab é uma declaração de guerra do governo contra o setor. “Uma
provocação”, é o coro uníssono.
A relação de Lula com o setor produtivo rural não é
boa nem antes, nem durante e muito menos depois das eleições. Setores do
regimento montado da política do Planalto juram que não vão ceder e que a Conab
vai mesmo para o Ministério do Desenvolvimento Agrário. Os ruralistas
entenderam o recado e o assunto virou uma questão de sobrevivência e honra.
Derrubar a medida no voto é a palavra de ordem, justamente o que o governo acha
que tem, mas não em quantidade suficiente.
Ao abrir o diálogo para evitar o confronto, os
congressistas mais jeitosos da FPA tentaram demover o governo da decisão em
relação à Conab. Na leitura desses mesmos interlocutores, ficou claro que o
governo resolveu dobrar a aposta, entendido como uma decisão deliberada de
esvaziar o Ministério da Agricultura, que tinha superpoderes na gestão
anterior.
Ainda no âmbito dessa disputa, o governo quer
também transferir a gestão do Cadastro Ambiental Rural (CAR) para debaixo das
asas de uma arquirrival do setor, a deputada licenciada e ministra do Meio
Ambiente, Marina Silva (REDE).
O Pará tem destaque na FPA. O Senador Zequinha
Marinho (PL-PA) é vice-presidente do colegiado, que em suas fileiras conta
ainda com os deputados Celso Sabino (União-PA), Delegados Éder Mauro e Caveira,
Joaquim Passarinho, os três do PL do Pará, Elcione Barbalho (MDB-PA) e Júnior
Ferrari (PSD-PA).
Proposta alternativa
O deputado Zé Silva (SD-MG), coordenador da
Comissão de Agricultura Familiar da FPA, apresentou à Presidência da República
uma requisição de desvinculação da Conab dos órgãos do governo federal e a sua
transformação em Agência de Inteligência do Agro Brasileiro.
Segundo o parlamentar, a Companhia cumpre papel
social fundamental, especialmente no suprimento de alimentos aos segmentos mais
carentes da população. “A empresa é responsável por políticas agrícolas e de
abastecimento que asseguram o atendimento das necessidades básicas da
sociedade,” explica.
Antes no Ministério da Agricultura (MAPA), a Conab
está hoje vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). “Vejo como
é estratégico dar à Conab autonomia e a garantia de recursos para a promoção da
segurança alimentar e nutricional, assegurando a todos o acesso à alimentos de
qualidade,” justifica o deputado.
Zé Silva destacou ainda que como instituição
essencial para o desenvolvimento da agricultura e do abastecimento, além de
agente crucial para a segurança alimentar, no Brasil e no exterior, “é
fundamental o seu redesenho como organização, desvinculando-a integralmente dos
órgãos do governo federal e transformando-a em agência de inteligência do agro
brasileiro.”
O parlamentar até o momento não teve resposta
quanto à solicitação, enquanto isso, os congressistas contrários à MP da
Esplanada, tentam juntar todas as forças para derrotar o governo no voto.
Por Val
André-Mutran – de Brasília